O valor preditivo dos ensaios não clínicos

Last update: 19 Novembro 2015

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Introdução

Desde o início do processo de investigação e desenvolvimento de medicamentos, os dados recolhidos em estudos não clínicos são fundamentais para a tomada de decisão da eficácia e segurança, por exemplo, no que respeita ao planeamento da gestão do risco, mitigação do risco, condições e especificações da autorização de introdução no mercado, a utilização do medicamento no mercado e a monitorização de segurança pós-comercialização (farmacovigilância).

As informações recolhidas durante os estudos não clínicos desempenha um papel fundamental nas decisões:

O quadro seguinte ilustra as necessidades e os fatores fundamentais durante o processo de investigação e desenvolvimento de medicamentos. As informações não clínicas desempenham um papel fundamental na determinação destas necessidades e fatores. Este artigo explora o papel importante dos estudos não clínicos como um preditor importante para a realização de estudos clínicos em doentes humanos.

Aspetos chave para um desenvolvimento de medicamentos bem sucedido – o “Princípio dos 5 R”1

  • Right target (Alvo correto)
    • Forte correlação entre o alvo do medicamento e a doença
    • Biomarcadores disponíveis e preditivos
  • Right tissue (Tecido correto)
    • Biodisponibilidade e exposição do tecido adequada
    • Definição dos biomarcadores farmacodinâmicos
    • Compreensão clara da farmacocinética e farmacodinâmica pré-clínica e clínica
    • Compreensão das interações com outros medicamentos (interações medicamento-medicamento)
  • Right safety (Segurança correta)
    • Margens de segurança claras
    • Compreensão dos riscos secundários de farmacologia
    • Compreensão dos metabolitos reativos, genotoxicidade e interações com outros medicamentos
    • Compreensão dos efeitos secundários perigosos e outros problemas
  • Right patients (Doentes corretos)
  • Right commercial potential (Potencial comercial correto)
    • Custo-benefício vs padrão de tratamento futuro
    • Foco no acesso ao mercado

Dos estudos laboratoriais e em animais até aos doentes

Um composto candidato não pode ser administrado em doentes humanos antes de ter sido obtida informação de suporte suficiente relativamente ao seu perfil de segurança e aos efeitos esperados. Os estudos não clínicos fornecem esta informação de suporte, fornecendo preditores importantes, tais como a “prova de conceito”, um regime posológico proposto, monitorização de segurança adequada e critérios de inclusão e exclusão adequados.

Como tal, os estudos não clínicos em células (in vitro) e os estudos em animais (in vivo) devem:

  • demonstrar a eficácia do composto candidato,
  • fornecer conhecimento sobre o perfil de segurança do composto candidato, por exemplo, estudos que investigam a dose máxima tolerada, e
  • estimar os efeitos do composto candidato que não podem ser estudados em seres humanos, por exemplo, o efeito do composto no feto ou em mulheres grávidas.

Extrapolação dos animais para os seres humanos

A extrapolação para a utilização de um medicamento em seres humanos, a partir das informações obtidas em laboratório e em estudos com animais requer uma avaliação profissional. Foram desenvolvidas e descritas regras úteis para os processos de extrapolação nas diretrizes do Committee for Medicinal Products for Human Use (Comité dos Medicamentos para Uso Humano) (CHMP)2 da European Medicines Agency (Agência Europeia de Medicamentos) (EMA) e da International Conference on Harmonisation (Conferência Internacional sobre Harmonização) (ICH)3. Estas diretrizes especificam os tipos de estudos que devem ser realizados antes de os ensaios clínicos poderem ser realizados.

Os problemas no programa não clínico de um composto candidato podem ser a causa de objeções durante a avaliação do pedido de autorização de introdução no mercado (AIM) durante a análise regulamentar. Estes casos podem levar a questões sobre a relevância dos modelos não clínicos utilizados para a indicação proposta a que o composto candidato se destina a tratar em seres humanos. De modo evitar estes problemas, os estudos não clínicos devem ser cuidadosamente planeados para que as expetativas criadas pelos estudos laboratoriais e em animais possam funcionar como preditores satisfatórios.

A extensão e o âmbito do programa não clínico que deve ser concluído satisfatoriamente antes dos ensaios clínicos podem ser iniciados varia de acordo com os seguintes fatores:

  • o tipo e a gravidade da doença alvo,
  • o tamanho da população e as dinâmicas que o composto candidato se destina a tratar,
  • a fase do ensaio clínica (Fase I, II, III, Fase IV pós-comercialização), e
  • a dose antecipada e a duração do tratamento em seres humanos.

Estas considerações são utilizadas para justificar os tipos de testes ou de modelos animais utilizados durante o programa não clínico.

Muitas empresas pedem aconselhamento científico sobre estudos não clínicos às autoridades regulamentares (por exemplo, à European Medicines Agency (Agência Europeia de Medicamentos) (EMA) ou às autoridades nacionais competentes). Este aconselhamento científico ajuda as empresas a garantir que são realizados os testes e estudos adequados, de modo a que não exista possibilidade de serem levantadas grandes objeções ao desenho dos testes durante o pedido de AIM. Pedir e seguir o aconselhamento destas agências, aumenta a probabilidade de um resultado positivo na fase de pedido de AIM. O aconselhamento é dado à luz do conhecimento científico atual e baseia-se na documentação fornecida pela empresa.

Os dados não clínicos são mais importantes nas fases iniciais do processo de desenvolvimento de um composto candidato (ver Figura 1). Quando um medicamento está disponível para prescrição (após o pedido de AIM), grande parte dos dados não clínicos sobre segurança e eficácia serão substituídos pelos dados de ensaios clínicos em doentes humanos. No entanto, em alguns casos, por exemplo o efeito de um composto candidato no desenvolvimento de cancro ou na reprodução, considerações éticas impedem a recolha de dados em seres humanos. Nestes casos, a utilização clínica de novos medicamentos será orientada por dados não clínicos durante mais tempo. No entanto, eventualmente isto também precisará de ser substituído por dados recolhidos nessas situações, por exemplo, como parte da gestão do ciclo de vida pós-comercialização, e da farmacovigilância.

A Figura 1 demonstra a importância relativa e a dependência dos dados não clínicos no processo de desenvolvimento de medicamentos ao longo do tempo. Os dados de estudos não clínicos baseiam-se em mais do que nos dados clínicos até mais tarde no processo de desenvolvimento.

Idealmente, todas as preocupações de segurança não clínicas geradas durante o período de desenvolvimento devem estar resolvidas no momento do pedido de AIM. No entanto, no momento da submissão e avaliação do dossier, as principais causas de preocupação de segurança podem ainda permanecer, incluindo, por exemplo, a carcinogenicidade, genotoxicidade, impurezas genotóxicas, toxicidade reprodutiva e hepatotoxicidade.

Considerações éticas

A aceitabilidade de utilizar animais como modelos de avaliação do risco nos seres humanos e para a utilização destes modelos para mimetizar doenças humanas é estabelecida na Declaração de Helsínquia.4 A Declaração de Helsínquia fornece a justificação ética e científica para a primeira exposição de compostos candidatos a voluntários saudáveis. Além disso, a Declaração afirma que investigação biomédica se deve basear em experimentação laboratorial e animal efetuada adequadamente e no conhecimento profundo da literatura científica. O bem-estar dos animais utilizados para investigação deve ser respeitado.

Estudos não clínicos: Preditores apropriados para estudos em seres humanos?

Historicamente, os desafios para o valor preditivo dos estudos não clínicos têm estado relacionados com aspetos farmacocinéticos, farmacodinâmicos (eficácia) e de segurança em seres humanos que não podem ser previstos facilmente pelos estudos não clínicos. Muitas novas tecnologias in silico (modelos de computador), farmacogenómica, biomarcadores e desenhos exploratórios inovadores para ensaios clínicos estão em rápido desenvolvimento, e todos têm uma influência positiva no valor preditivo dos estudos não clínicos.

Outros recursos

Referências

  1. Adapted from Cook, D., Brown, D., Alexander, R., March, R., Morgan, P., Satterthwaite, G., & Pangalos, M. (2014). Lessons learned from the fate of AstraZeneca's drug pipeline: A five-dimensional framework. Nature Reviews Drug Discovery, 13, 419-431. doi:10.1038/nrd4309
  2. European Medicines Agency. (2015) Non-clinical guidelines. Retrieved 24 July, 2015, from http://www.ema.europa.eu/ema/index.jsp?curl=pages/regulation/general/general_content_000083.jsp&mid=WC0b01ac0580027548
  3. International Conference on Harmonisation (2015). ICH Guidelines. Retrieved 24 July, 2015, from http://www.ich.org/products/guidelines.html
  4. World Medical Association. (2013) WMA Declaration of Helsinki – Ethical Principles for Medical Research Involving Human Subjects. Retrieved 24 July, 2015, from http://www.wma.net/en/30publications/10policies/b3/
  5. Nieto-Guiterrez, M. (2011) Non-clinical Assessment Requirements. Brussels: European Medicines Agency. Retrieved 24 July, 2015, from http://www.ema.europa.eu/docs/en_GB/document_library/Presentation/2011/06/WC500107868.pdf

Anexos

A2-2.02.1-v1.3

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