Last update: 15 Julho 2015
Introdução
A fase de desenvolvimento não clínico (ou pré-clínico) tem como principal objetivo identificar qual a terapia candidata que apresenta a maior probabilidade de sucesso, avaliar a sua segurança e criar bases científicas sólidas antes da transição para as fases de desenvolvimento clínico.
Adicionalmente, durante a fase de desenvolvimento não clínico, o composto candidato deverá cumprir objetivos não médicos como a definição dos direitos de propriedade intelectual e fazer com que esteja disponível medicamento suficiente para os ensaios clínicos. O desenvolvimento não clínico de um medicamento é complexo e depende da regulamentação.
Aspetos básicos, definições chave e conceitos
“Não clínico” ou “pré-clínico”?
Os termos “não clínico” e “pré-clínico” são muitas vezes utilizados indistintamente.
Embora sejam de relevância crítica nas fases pré-clínicas do desenvolvimento, podem ser realizados estudos não clínicos em qualquer momento durante o ciclo de vida do produto. Na maioria dos casos é mais conveniente realizá-los o mais cedo possível para evitar surpresas posteriores durante o desenvolvimento.
Além da identificação da farmacodinâmica (efeito de um medicamento no organismo), a farmacocinética (efeito do organismo no medicamento) e a toxicologia do composto candidato antes da sua administração em seres humanos, os dados dos estudos não clínicos são utilizados para refinar, consolidar e adicionar informação para atualizar o perfil de segurança do produto durante a fase pré-clínica, no momento do registo e durante o ciclo de vida do produto medicinal.
Estudos In silico, in vitro e in vivo
Os estudos no desenvolvimento não clínico são realizados:
- In silico: “realizados por computador ou por simulação em computador”, p. ex. prevendo o perfil toxicológico de um produto utilizando a sua estrutura química a partir de aproximações baseadas em dados.
- In vitro (em latim “dentro do vidro”): realizar um procedimento num ambiente controlado fora de um organismo vivo, p. ex. utilização de culturas de hepatócitos (células do fígado) para estudos de metabolismo.
- In vivo (em latim “dentro do vivo”): experimentação utilizando um organismo vivo completo em vez de tecidos ou células; ou seja, animais, seres humanos ou plantas.
Quais são os aspetos chave da Química, Fabrico, Controlo (CMC- Chemistry, Manufacturing, Control) durante o desenvolvimento não clínico?
Todos os estudos de desenvolvimento não clínico necessitam o fabrico de uma substância ativa adequada:
- São geralmente necessárias pequenas quantidades (miligramas a gramas) para os estudos não clínicos; em seguida, deve ser desenvolvido um processo de transição de escala (scale-up) para produzir quantidades maiores para os ensaios clínicos e, posteriormente, após a aprovação, para a sua comercialização.
- São necessários lotes da substância ativa certificados ou de Boas Práticas de Fabrico (BPF) para os estudos de Boas Práticas de Laboratório (BPL).
Alguns dos passos chave de CMC durante a fase de desenvolvimento não clínico incluem:
- Determinação da dose e da administração
- Caracterização físico-química detalhada
- Testes de estabilidade & análise de impurezas
- Desenvolvimento e validação de métodos para quantificar a substância ativa em fluídos corporais como no sangue, no plasma, na urina em estudos de atividade e de efeitos secundários
- Desenvolvimento de um protótipo do que será utilizado na clínica.
Processo de desenvolvimento não clínico
Atividades de desenvolvimento não clínico decorrem em paralelo com as atividades de investigação. Deverão apoiar o programa de desenvolvimento clínico planeado abordando os objetivos e questões colocadas abaixo.
Objetivos
Assim que um composto candidato é identificado, o desenvolvimento não clínico deverá ser iniciado respondendo às seguintes questões e as respostas serão obtidas de avaliações/estudos específicos):
- Funciona? → avaliação da eficácia
- Como será administrado e como irá o organismo reagir? → identificação de perfis
- É seguro? → toxicologia/segurança
- O seu fabrico é viável e controlável?
As atividades de desenvolvimento não clínico podem continuar ao longo do ciclo de vida do produto. No entanto, quanto mais cedo se responder a estas questões, mais fácil será identificar o perfil do doente que terá mais benefícios.
Gestão do projeto
O programa de desenvolvimento não clínico é complexo e requer capacidades sólidas de gestão de projetos e de comunicação para gerir equipas multidisciplinares. A equipa do projeto tem de compreender o plano clínico pretendido de modo a definir o plano não clínico e as atividades associadas.
O perfil fornece um plano para executar a estratégia de desenvolvimento não clínico, definindo objetivos, riscos, responsabilidades, métricas e tomada de decisões Avançar/Não avançar. A implementação de perfis ajuda a manter o foco do projeto nos critérios chave do produto, a tomar decisões Avançar/Não avançar de forma atempada e a reduzir o risco global do projeto (ou seja, o desenvolvimento continuado de um produto não útil).
Diretrizes regulamentares não clínicas
No desenvolvimento de medicamentos estão envolvidos muitos intervenientes, e cada organização ou instituição segue as suas próprias normas. Por exemplo, as empresas têm os seus Procedimentos Operacionais Normalizados (SOP – Standard Operating Procedures). Além das disposições de Boas Práticas Clínicas, as diretrizes podem ser consultadas no sitio da Internet da Agência Europeia de Medicamentos (EMA).
- Algumas são gerais e outras mais específicas na abordagem de aspetos científicos e técnicos (p. ex. específicos para os estudos toxicológicos requeridos).
- Devem ser estritamente seguidas em qualquer novo pedido de autorização de introdução no mercado. No caso de qualquer desvio, este deverá ser justificado.
Os dados são apresentados em conformidade com o formato do Documento Técnico Comum (CTD), conforme definido pela Conferência Internacional sobre Harmonização de Requisitos Técnicos para o Registo de Produtos Farmacêuticos para Uso Humano (ICH). O acordo para reunir toda a informação de Qualidade, Segurança e Eficácia neste formato comum (o CTD) revolucionou o processo de análise regulamentar e levou a submissões eletrónicas harmonizadas que, por sua vez, permitiu a implementação de boas práticas de análise. Para a indústria, eliminou a necessidade de reformatar a informação para submissão às diferentes autoridades regulamentares (a ICH reúne as autoridades regulamentares e a indústria farmacêutica da Europa, Japão e dos EUA para debater os aspetos científicos e técnicos do registo de medicamentos).
O CTD é organizado em cinco módulos (ver a figura abaixo). Em julho de 2003, o CTD tornou-se no formato obrigatório para os novos pedidos de autorização de introdução no mercado na UE e Japão, e no formato de eleição fortemente recomendado para Pedidos de Comercialização de um Novo Medicamento (NDA) submetidos à Administração de Alimentos e Medicamentos (FDA - Food and Drug Administration) dos Estados Unidos.
Resumo
A fase de desenvolvimento não clínico é fundamental e deve prever potenciais problemas antes de um composto passar para a fase de desenvolvimento clínico.
Para que um composto candidato possa passar ao estudo clínico é necessário:
- Uma avaliação de segurança não clínica obtida em conformidade com as Boas Práticas de Laboratório (BPL).
- Que o fabrico tenha sido realizado com os controlos de qualidade apropriados.
- Dados e processos documentados de acordo com o formato CTD e que sirvam de base para a fase de desenvolvimento clínico.
Existe um aumento da tendência para desenhar propriedades do tipo medicinal in silico, assim como para utilizar métodos bioinformáticos para modelagem e previsão.
As diretrizes de desenvolvimento não clínico estão sujeitas a uma harmonização contínua entre as principais autoridades regulamentares (Europa, EUA e Japão) principalmente no que diz respeito à segurança e à qualidade. A ICH publica periodicamente orientações detalhadas para a indústria farmacêutica, semelhantes às publicadas pelas agências Europeia (EMA) e Americana (FDA).
Outros recursos
- European Medicines Agency (2007a). Guideline on strategies to identify and mitigate risks for first-in human trials with investigational medicinal products. London: European Medicines Agency. Retrieved 25 June, 2015, from http://www.ema.europa.eu/docs/en_GB/document_library/Scientific_guideline/2009/09/WC500002988.pdf
- European Medicines Agency (2007b). Guideline on requirements for first-in-man clinical trials for potential high-risk medicinal Retrieved 25 June, 2015, from http://www.ema.europa.eu/docs/en_GB/document_library/Scientific_guideline/2009/09/WC500002989.pdf
- European Medicines Agency (2009). ICH guideline M3(R2) on non-clinical safety studies for the conduct of human clinical trials and marketing authorisation for pharmaceuticals. London: European Medicines Agency. Retrieved 25 June, 2015, from http://www.ema.europa.eu/docs/en_GB/document_library/Scientific_guideline/2009/09/WC500002720.pdf
- European Medicines Agency (2011). Committee for medicinal products for human use (CHMP) ICH guidelines S6 (R1) – preclinical safety evaluation of biotechnology-derived pharmaceuticals. London: European Medicines Agency. Retrieved 25 June, 2015, from http://www.ema.europa.eu/docs/en_GB/document_library/Scientific_guideline/2009/09/WC500002828.pdf
Referências
- Image reproduced from ICH (2015). M4: The Common Technical Document. Retrieved 11 July, 2021, from https://www.ich.org/page/ctd
- European Medicines Agency (2009). ICH guideline M3(R2) on non-clinical safety studies for the conduct of human clinical trials and marketing authorisation for pharmaceuticals. London: European Medicines Agency. Retrieved 25 June, 2015, from http://www.ema.europa.eu/docs/en_GB/document_library/Scientific_guideline/2009/09/WC500002720.pdf
A2-2.01.1-1.2